Falando a partir de um centro de detenção na Califórnia, uma imigrante iraniana diz que não pode voltar ao Irã e acredita que ‘as pessoas boas serão libertas’. Arpineh e o marido, Arthur, com os filhos em uma época mais feliz, antes de os agentes de imigração chegarem à casa da família
Arthur Sahakyan via BBC
Se Arpineh Masihi pudesse votar, ela teria votado em Donald Trump. Ela é uma defensora devota do presidente dos Estados Unidos — até mesmo agora, que está detida como imigrante ilegal.
“Ele está fazendo a coisa certa porque muitas dessas pessoas não merecem estar aqui”, disse Arpineh à BBC News por telefone, falando do centro de detenção de imigrantes de Adelanto, no Deserto de Mojave, na Califórnia.
“Eu o apoiarei até o dia da minha morte. Ele está tornando os EUA grande novamente.”
A 96 quilômetros de distância, em sua casa em Diamond Bar, uma rica cidade suburbana no leste do condado de Los Angeles, uma bandeira de Trump tremula no jardim. Bonés com a inscrição “Maga” (acrônimo para Make America Great Again, ou Torne a América Grande Novamente, lema do movimento trumpista) decoram uma prateleira ao lado de um álbum de fotos da família, enquanto pássaros de estimação cantam em uma gaiola.
É uma casa animada, com três cachorros e quatro crianças pequenas, e o marido e a mãe de Arpineh estão com os olhos cansados e exaustos de preocupação, tentando manter a calma.
“Nosso lar está destruído”, diz Arthur Sahakyan, marido de Arpineh.
‘Todos nós cometemos erros’
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Em muitos aspectos, Arpineh, de 39 anos, é uma história de sucesso americana — um excelente exemplo de como o país dá às pessoas uma segunda ou até mesmo uma terceira chance. A mãe de Arpineh se emociona ao falar sobre a filha, que vive nos EUA desde os três anos.
Ela passou por uma fase difícil há muitos anos, em 2008, quando foi condenada por furto qualificado e roubo e recebeu uma pena de dois anos de prisão. Um juiz de imigração revogou seu green card (o cartão de residência permanente nos EUA), o que é uma prática comum. Mas como ela é uma iraniana cristã de origem armênia, o juiz permitiu que ela permanecesse no país em vez de ser deportada.
“Somos cristãos. Ela não pode voltar, de jeito nenhum”, diz Arthur, enquanto sua filha de 4 anos entra e sai correndo do quarto. Ele teme que a vida dela corra risco se for mandada de volta ao Irã.
Mas, desde que foi liberta da prisão, Arpineh reconstruiu sua vida, começando um negócio bem-sucedido e uma família, entre centenas de milhares de imigrantes iranianos que chamam o sul da Califórnia de lar.
O oeste de Los Angeles — muitas vezes chamado de Tehrangeles (em referência a Tehran, nome da capital iraniana em inglês — tem a maior população de iranianos fora do Irã.
Alguns, como Arpineh, foram detidos nas últimas semanas, durante as batidas de imigração que deixaram a cidade em alerta. Embora a maioria das pessoas detidas em Los Angeles seja do México, as atualizações diárias do Departamento de Segurança Interna mostram que imigrantes de praticamente todos os cantos do mundo foram presos.
Trump foi eleito em parte por causa da promessa de “lançar o maior programa de deportação de criminosos da história” — uma promessa na qual Arpineh, seu marido e sua mãe ainda dizem que acreditam.
No entanto, sua família diz que tem fé que Arpineh vai ser liberta, e acredita que somente os criminosos mais perigosos vão ser de fato deportados.
“Eu não culpo Trump, eu culpo Biden”, diz Arthur. “A fronteira aberta é obra dele, mas acredito no sistema, e que todas as pessoas boas serão libertas, e as ruins serão mandadas de volta.”
Embora muitos dos detidos não tenham antecedentes criminais, Aprineh é uma criminosa condenada, o que a torna um alvo preferencial para remoção.
O Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, na sigla em inglês ) não respondeu a um pedido de comentário sobre o caso de Arpineh.
Arthur diz que não sabe detalhes sobre o crime. Eles conversaram brevemente sobre isso antes de se casarem, e depois ele se esqueceu do que considerava um vacilo juvenil da esposa.
Em vez disso, ele se concentra nas boas ações dela nos últimos 17 anos, trabalhando como voluntária no distrito escolar local e levando comida para bombeiros e policiais.
“Todos nós cometemos erros”, diz ele.
‘Não importa o que aconteça, nós vamos te pegar’
Então, quando o ICE telefonou para Arpineh em 30 de junho, enquanto a família tomava café da manhã, o casal pensou que fosse uma piada.
Mas a polícia de imigração chegou na casa deles 30 minutos depois.
Arpineh conversa com agentes de imigração do lado de fora de casa antes de ser detida
Arthur Sahakyan via BBC
Apesar das placas espalhadas por todo o condado de Los Angeles pedindo aos imigrantes que “conhecessem seus direitos” e não abrissem a porta para os agentes de imigração, o casal saiu para falar com os policiais.
Arpineh explicou que um juiz havia permitido que ela ficasse nos EUA por causa da situação no Irã, desde que não cometesse nenhum outro crime e se apresentasse com frequência aos agentes de imigração. A última vez foi em abril, ela se apresentou a eles, apresentando sua documentação.
Arthur contou que até os convidou para entrar na casa, mas eles recusaram.
Os agentes de imigração disseram a ela que as circunstâncias haviam mudado e que tinham um mandado de prisão contra ela.
Eles permitiram que ela voltasse para dentro de casa e se despedisse dos filhos — de 14, 11, 10 e 4 anos. E disseram que, se ela não saísse de novo, eles a pegariam em algum momento.
“Eles nos disseram que, não importa o que aconteça, nós vamos te pegar — talvez quando você estiver dirigindo na rua com seus filhos —, então pensamos no que estávamos vendo no noticiário: bombas de efeito moral, carros sendo fechados”, diz Arthur. Eles não queriam arriscar que ela fosse detida de forma violenta, possivelmente com as crianças assistindo.
“Ela entrou e deu um beijo de despedida nas crianças”, ele recorda. “Ela saiu como uma campeã, e disse: ‘Estou aqui’.”
Arthur pediu aos agentes de imigração que não algemassem a esposa. Eles disseram que isso não era possível, mas concordaram em fazer isso do outro lado do veículo para que os filhos do casal não vissem.
“Eu sabia que meus filhos estavam assistindo lá de cima”, diz ele. “Não queria que eles vissem a mãe algemada.”
Arpineh foi levada então para um prédio federal no centro de Los Angeles, um centro usado pelo ICE para processar as pessoas presas nas batidas em andamento na região. O prédio se tornou o centro de protestos, às vezes violentos, contra o ICE, que tomaram conta de Los Angeles por semanas.
Ela afirma que as pessoas detidas no prédio “eram tratadas como animais”.
Arpineh disse à BBC que ficou presa em uma sala gelada e bem iluminada com outras 28 mulheres por três dias. Segundo ela, elas sobreviveram com lanches e uma garrafa de água por dia, se amontoando para se aquecer e dormindo no chão.
À espera de um indulto
Como Arpineh fala três idiomas — armênio, espanhol e inglês —, ela conseguiu se comunicar com muitas das outras mulheres, e diz que elas se ajudavam mutuamente.
Três dias depois, ela foi transferida para Adelanto, o centro de detenção privado do ICE no deserto a nordeste de Los Angeles, que tem a reputação de oferecer condições severas, semelhantes às de uma prisão.
Mas Arpineh diz que é muito melhor do que o que elas enfrentaram no centro de Los Angeles — agora ela faz três refeições por dia, tem acesso a chuveiros e uma cama. Embora tenha ouvido falar que é difícil conseguir tratamento médico se você precisar, Arpineh é jovem e saudável.
“Mas ainda é muito desafiador”, diz ela.
Ela e o marido dizem que ainda têm fé no governo Trump e acreditam que ela vai ser liberta.
“Não sou deportável para nenhum país,” disse Arpineh à BBC do centro de detenção.
Mas isso não impediu as autoridades de imigração no passado. Em fevereiro, um grupo de cristãos iranianos que havia acabado de cruzar a fronteira do México foi deportado — mas para o Panamá, não para o Irã.
Arpineh continua esperançosa em relação a um indulto, mas observa que também se sentiu desanimada.
Ela diz que ama os EUA e que se sente americana, mesmo que não tenha a documentação necessária.
Ela liga para o marido a cobrar uma vez por hora para que possam compartilhar atualizações sobre seu processo, embora até agora não haja muito o que compartilhar. Os filhos mais velhos entendem o que está acontecendo, mas a filha de 4 anos fica perguntando quando a mamãe vai voltar para casa, diz ele.
Todos os quatro filhos são cidadãos americanos, nascidos e criados na Califórnia. O casal acredita que as autoridades vão levar isso em consideração ao decidir o destino de Arpineh.
“Tenho quatro filhos cidadãos. Tenho um negócio. Tenho uma propriedade. Tenho carros”, diz Arpineh.
“Não fiz nada de errado em tantos anos.”

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