Queima de combustíveis fósseis é uma das principais causas do aquecimento global.
Divulgação – Pixabay.
Um relatório do Departamento de Energia dos Estados Unidos afirma que as projeções de mudança climática futuras são exageradas e minimiza o papel das emissões no aquecimento do planeta. A posição é criticada por especialistas que sinalizam a posição como “uma agenda para promover combustíveis fósseis”.
➡️ Contexto: os Estados Unidos assumiu no ano passado, durante a COP, junto a outros países pelo mundo o compromisso de fazer a transição energética. Isso significa usar menos combustíveis fósseis. As medidas foram assumidas, no entanto, durante o governo Biden. Desde que foi eleito, Trump vem retrocedendo nas questões ambientais, incluindo a saída do Acordo de Paris.
Intitulado “Uma análise crítica dos impactos das emissões de gases de efeito estufa no clima dos Estados Unidos”, o documento foi elaborado por um grupo de cinco cientistas conhecidos por terem posições céticas em relação ao consenso científico sobre o aquecimento global. Entre eles, nomes como Judith Curry e Steven Koonin, frequentemente citados por negacionistas.
Vale lembrar que o relatório foi publicado pelo departamento depois da demissão de todos os pesquisadores que trabalhavam em uma análise nacional de como as emissões estariam afetando o clima nos Estados Unidos. Um documento que poderia nortear estados a se protegerem de extremos, como o que houve na Califórnia e no Texas.
O documento foi encomendado pelo secretário de Energia, Christopher Wright — entusiasta da indústria fóssil — que afirma oferecer uma “visão alternativa” às conclusões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
O texto minimiza o papel dos gases do efeito estufa no aquecimento global e sugere que os modelos climáticos superestimam os impactos futuros das emissões.
“Muitos se surpreenderão com as conclusões, que diferem em pontos importantes da narrativa dominante. Isso mostra o quão longe o debate público se afastou da própria ciência”, afirma o secretário Wright no prefácio do documento.
O que diz o relatório
Com 130 páginas, o relatório argumenta que:
O dióxido de carbono (CO₂) não deve ser considerado um poluente, uma vez que promove o crescimento vegetal e melhora a produtividade agrícola (o chamado global greening).
Modelos climáticos seriam “exageradamente sensíveis” ao CO₂ e “inadequados” para prever o futuro climático.
A maior parte dos eventos climáticos extremos nos EUA — como furacões, ondas de calor e enchentes — não apresentaria tendência de aumento ligada às emissões humanas.
O aumento do nível do mar estaria dentro da média histórica e seria influenciado principalmente por fatores locais, como a subsidência do solo.
O impacto de políticas dos EUA sobre o clima global seria “indetectável” e as medidas de mitigação poderiam causar mais danos econômicos do que benefícios.
Além disso, o relatório critica duramente o uso do cenário RCP8.5 — considerado extremo — como “base” para projeções de impacto em políticas climáticas.
Cientistas conhecidos por desafiar o consenso
Todos os cinco autores do relatório já estiveram no centro de controvérsias sobre mudanças climáticas. Judith Curry, por exemplo, é frequentemente citada em audiências republicanas no Congresso por minimizar os riscos do aquecimento global.
Steven Koonin, ex-conselheiro científico do Departamento de Energia no governo Obama, escreveu um livro em que critica o “alarmismo” climático.
John Christy e Roy Spencer, ambos da Universidade do Alabama, são conhecidos por contestarem dados de aquecimento com base em medições por satélite.
Reações e críticas
Especialistas em clima e instituições acadêmicas reagiram com preocupação ao conteúdo e à forma de divulgação do relatório. O temor é que o documento seja usado como ferramenta política para desacreditar ações climáticas e enfraquecer regulações ambientais.
“Esta é uma agenda para promover combustíveis fósseis, não para proteger a saúde pública, o bem-estar ou o meio ambiente,” afirma Rachel Cleetus, diretora da organização Union of Concerned Scientists e coautora da sexta Avaliação Nacional do Clima dos EUA, em entrevista ao jornal The Guardian.
O jornal britânico também questionou o Departamento de Energia sobre as críticas de que o relatório estaria repleto de desinformação. Em resposta, o porta-voz Ben Dietderich afirmou:
“Este relatório avalia criticamente muitas áreas de investigação científica em andamento que frequentemente recebem altos níveis de confiança — não pelos cientistas, mas por órgãos políticos envolvidos, como as Nações Unidas ou administrações presidenciais anteriores.”
A Union of Concerned Scientists também aponta que o relatório ignora ou distorce evidências amplamente aceitas pela comunidade científica internacional — como o papel crescente das emissões humanas no agravamento de eventos extremos e a aceleração do aquecimento global nos últimos 50 anos.
Um novo capítulo do negacionismo climático oficial
Desde que voltou à presidência dos EUA, Trump tem retomado pautas antiambientais, desregulando setores da indústria fóssil, restaurando oleodutos e retirando investimentos em energia limpa.
O relatório é a primeira grande peça “científica” do novo mandato, reforçando a retórica de que as políticas ambientais representam uma ameaça ao crescimento econômico americano.
Ao mesmo tempo, os autores do relatório insistem que seu objetivo é promover o “debate científico honesto” e corrigir o que veem como exageros na narrativa climática predominante.
Para os especialistas em clima citados nesta reportagem, porém, trata-se de uma estratégia com aparência técnica, mas motivação política clara — enfraquecer as bases científicas das ações climáticas em nome de interesses econômicos de curto prazo.

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